Onze visões

“Parecia coisa de filme”. Os atentados de 11 de setembro de 2001 deixaram essa impressão em muitos. Mesmo para quem acompanhava tudo aqui no Brasil, aquilo foi tão impactante e assustador que poderia muito bem ser um produto de cinema. Não foi à toa, que o evento rapidamente parou nas telonas.

O filme 11 de setembro (11’09″01, no título original) foi lançado logo em 2002. Tendo os ataques aéreos da Al Quaeda como ponto de partida, onze cineastas de diferentes nacionalidades foram convidados a realizar um curta-metragem com duração de 11 minutos, 9 segundos e um frame. A idéia veio do produtor francês Alain Brigand.

Os diretores foram: Samira Makhmalbaf, do Irã; Claude Lelouch, da França; Youssef Chahine, do Egito; Danis Tanovic, da Bósnia-Herzegovina; Idrissa Ouedraogo, de Burkina Faso; Ken Loach, do Reino Unido; Alejandro González Iñárritu, do México; Amos Gitai, de Israel; Mira Nair, da Índia; Sean Penn, dos Estados Unidos e Shôhei Imamura, do Japão. Tal diversidade de pontos de vista alcançou um resultado bastante plural.

O projeto abre com Samira Makhmalbaf. Em uma escola de um campo de afegãos refugiados no Irã, uma professora tenta explicar aos alunos o que ocorreu em Nova York. No início, vemos que as crianças estão mais preocupadas com o que está ao redor delas. Quando os pequenos tentam compreender melhor o que ocorreu, eles procuram ver pela ótica da religião. Com o olhar infantil, os estudantes se perguntam se um Deus poderia ou não ter participação naquilo. Veja o curta a seguir. As legendas estão em espanhol.

O questionamento religioso também está presente em outros trabalhos. Shôhei Imamura e Alejandro González Iñárritu encerram seus filmes com cartelas mostrando frases que levantam dúvidas sobre o papel da fé em conflitos armados. Imamura, que talvez apresente a obra mais incomum entre as onze, é convicto nas palavras que encerram a sua produção: “There is no such thing as a Holy War” (“Não há tal coisa como uma Guerra Santa”).

Iñarritu põe em debate se a ”a luz de Deus nos guia ou nos cega”. O que mais se destaca nesse segmento é o uso do áudio dos atentados de Nova York. Vemos por poucos segundos pessoas se jogando do World Trade Center e essas cenas demoram a aparecer. Por praticamente onze minutos, o espectador tem apenas uma tela em preto e os ruídos dos ataques. Tal abordagem é original se levarmos em consideração que os atentados do 11 de setembro produziram inúmeras imagens.

Se o exemplo do México prioriza o som, a produção francesa evidencia o silêncio. Claude Lelough fez um filme quase todo mudo. Sua protagonista é uma fotógrafa francesa que vive em Nova York. Ela é surda, o que justifica a escolha do cineasta. A personagem principal vive uma crise no relacionamento com um guia de turismo da cidade. Um dos temas da trama é a falta de comunicação entre o casal. Assista abaixo ao que Lelough fez.

Um casamento já acabado é o centro do fragmento dirigido por Sean Penn. A queda das torres gêmeas ilumina literalmente o que está de errado na vida de um velhinho. Na primeira parte do enredo, vemos este senhor vivendo como se ignorasse a morte da mulher. Esse estado é até mais triste do que o de uma solidão consciente. Confira a seção de Penn aqui.

Podemos fazer uma comparação dessa situação mostrada por Sean Penn com o que aconteceu com os americanos após o 11 de setembro. Antes, a população não percebia nada errado com os EUA. De certa forma, a tragédia esclareceu que havia algo de equivocado na autoritária política externa do país.

A crítica ao jeito norte-americano de governar o mundo é notada na direção de Ken Loach. O cineasta trata de outro 11 de setembro, o de 1973, data do golpe contra Salvador Allende. O narrador do curta é o chileno Pablo, que fora perseguido na ditadura. Ele escreve uma carta em solidariedade às vítimas dos atentados aos EUA.

Ao descrever com detalhes o que aconteceu com a sua nação, Pablo destaca o apoio de Washington à ditadura no Chile. Ele deseja que as vítimas dessa violência na América Latina não sejam esquecidas. Com esse pedido e com o filme de Loach, eu me despeço por essa semana.

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