por Jéssica Lauritzen
“(…) dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. (…) Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. (…) Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca (…) como se quisesse tragar também o nadador da manhã.” (Dom Casmurro – Machado de Assis)
Já imaginou ser surpreendido por uma onda gigante enquanto caminha pela calçada? Tão encantadoras e perigosas quanto os olhos da personagem de Machado de Assis são as ressacas que ocorrem diversas vezes ao ano no litoral brasileiro. As ondas grandes são capazes de causar acidentes com barcos de pesca, alagar ruas, destruir orlas, calçadões, casas à beira-mar e arrastar pessoas. Como quase sempre é possível prevê-las com uma antecedência de até cinco dias, os banhistas, pedestres e pescadores mais precavidos se afastam do mar agitado; os surfistas, ao contrário, caem na água sempre em busca da “onda perfeita”*.
A turbulência marítima que dá nome também ao típico mal-estar após uma bebedeira tem origem na palavra resaca, em espanhol, que significa “refluxo do mar”. Assim como é importante respeitar os limites do organismo, há que se respeitar o mar para não ser tragado por ele.
Este fenômeno natural é causado por fortes e geladas rajadas de ventos (de até 50 km/hora), trazidas, em geral, pelas frentes frias, que ocorrem em regiões de baixa pressão atmosférica, ainda em alto mar. Essa massa de ar induz o aumento do nível do oceano e se intensifica ao percorrer o mar aberto. Com velocidade crescente sobre o curso das correntes marítimas, as ondas formadas costumam alcançar até 5 metros de altura e quebram violentamente ao chegar ao litoral.
A maré alta que está envolvida nas ressacas marítimas é influenciada pelas chuvas, pelas fases lunares e, em menor dimensão, pela atração solar. Durante os períodos de Lua Cheia ou Lua Nova, por exemplo, a maré sobe mais, como pode ser entendido no quadro abaixo. Nesses casos, os episódios de ressaca assumem proporções mais graves, ocasionando maiores estragos nos locais atingidos.
LUA NOVA
Quando a Terra, a Lua e o Sol se alinham, a atração gravitacional exercida pelos dois astros sobre os oceanos se soma, gerando correntes marítimas que causam uma elevação máxima do nível do mar na direção dessa linha. É época das maiores marés altas, chamadas de marés de sizígia ou máximas.
LUA MINGUANTE
Nessa fase lunar, diminui a influência do Sol e da Lua nas marés oceânicas. Na noite em que metade da Lua está visível, a atração atinge seu menor valor. Em Santos, no litoral paulista, por exemplo, a diferença entre a maré alta e a baixa não ultrapassa os 5 centímetros.
LUA CHEIA
Cerca de duas semanas depois da Lua Nova, nosso satélite viaja de novo para uma posição em que se alinha com o Sol e a Terra. Essa combinação traz uma nova leva de marés máximas. Nas praias de Santos, o nível do mar pode subir em torno de 1 metro nesse período.
LUA CRESCENTE
Agora, a Lua e o Sol formam um ângulo reto de 90º. Nessa situação, a gravitação lunar se opõe à solar – elas só não se anulam porque a Lua, mais perto da Terra, exerce maior poder de atração. Mesmo assim, as diferenças de nível entre as marés alta e baixa são muito menores e recebem o nome de marés de quadratura ou mínimas.
(Fonte: Revista Mundo estranho/ Ed. Abril)
*Veja matéria exibida pelo Fantástico, em 2010, sobre uma forte ressaca que atingiu o Rio de Janeiro com ondas de aproximadamente 10 metros de altura na Baía de Guanabara: http://www.youtube.com/watch?v=mnD-zFur3Z0