1001 Desabafos

Embora a coluna não seja destinada a assuntos factuais, devo confessar que a tragédia envolvendo o ônibus da empresa Viação 1001, na serra, me deixou transtornada. Não só pelo número de vítimas, incluindo o motorista, mas também porque eu realmente poderia estar naquele ônibus. E a ideia me apavora.

Desde que aconteceu um grave acidente com a minha mãe, no início do ano, eu sou obrigada a viajar para o interior, a cada 15 dias, para dar-lhe o mínimo de assistência. Então, não tem jeito: eu me meto num ônibus, porque não tenho carro e tampouco sei dirigir, e encaro seis, sete, oito horas de uma viagem nem um pouco confortável.

E a 1001 é a única empresa responsável pelo transporte de passageiros da capital para o interior do estado do Rio. Até aí tudo bem. Há anos que ela administra o percurso e acidentes como o de ontem são fatos isolados. Aliás, acho importante dizer, são raros. Entretanto, isso não encobre outros deslizes significativos por parte da empresa.

Vamos começar pela frota de ônibus. Normalmente, quem viaja à noite não está a fim de curtir a paisagem. Mesmo porque está escuro e não há nada para se ver. O passageiro simplesmente quer embarcar e dormir. Então, por que a 1001 não disponibiliza apenas os “carros executivos”, como são chamados os veículos que oferecem, entre outros, poltronas com espaço para colocar os pés?

Pode parecer tolice, mas isso faz toda a diferença para quem vai ficar horas sentado em uma poltrona reclinável. Ademais, aumenta o espaço entre as cadeiras e não sacrifica tanto aqueles que têm as pernas compridas. Já reclamei a respeito e um fiscal alegou que não há tantos ônibus disponíveis nessas condições, além de a medida encarecer o preço da passagem.

Não é bem assim. Quem viajar durante o dia verá que a maioria dos carros são executivos, portanto, é muito mais uma questão de distribuição e planejamento. E depois, sabemos que o valor da passagem é condicionado por outros fatores, tais como: quilometragem, número de pedágios na estrada, etc. Portanto, acho realmente uma falta de respeito pagar R$80 do Rio até o interior, indo pela serra, quando o percurso Niterói-Campos é mais longevo e a passagem, não raro, é mais barata.

Outra coisa é a questão do ar condicionado. Tudo bem que você está num veículo fechado, com várias pessoas respirando no mesmo ambiente, e o risco de contrair alguma doença infecciosa pelo ar é grande. Porém, isso não impede que eventualmente a temperatura possa ser ajustada. Por diversas ocasiões, eu testemunhei idosos, crianças passando mal dentro do ônibus devido ao frio e os motoristas darem de ombros, como se nada pudesse ser feito.

Sobre o acidente de ontem, especulam ele tenha ocorrido por falha do motorista, ao ignorar um suposto problema nos freios. Nada mais óbvio, sobretudo porque ele não está vivo para se defender. Todavia, é como eu disse, eu viajo frequentemente e, em razão disso, acabei desenvolvendo uma relação de cordialidade com alguns deles, que me conhecem pelo nome, sabem onde eu vou ficar.

Entre muitas idas e vinda, já ouvi queixas dos próprios de que estão assoberbados. O intervalo entre uma viagem e outra é pequeno, em média seis horas – tempo em que eles precisam levar o ônibus para garagem, onde ele é limpo; fazer uma refeição; e cochilar um pouco antes de caírem na estrada novamente.

Embora eles não viajem diariamente, a rotina é puxada. Com isso, já se economiza no “bom dia”, no “boa tarde”. Muitos deles se esquecem de fazer a vistoria na parada obrigatória, para certificar-se de que o número de passageiros coincide com o número de passagens, de que não ficou ninguém perdido ou pegou o ônibus errado, de que não tem gente demais no ônibus, com intenção de assaltar ou fazer sei-lá-o-quê lá dentro.

Enfim, pequenos deslizes que uma vez corrigidos fariam toda a difrença. Apesar de não conhecer as vítimas, é difícil não lamentar a morte daquelas pessoas, não lamentar esses pequenos incidentes ocorridos diariamente, e lamentar mais ainda o fato de eu ter que pegar tal ônibus na próxima semana.

Resumo do que os jornais noticiaram sobre a Viação 1001:

24/10:

1) A empresa tem 700 ônibus e 553 multas, segundo o Detro;

2) A ANTT lavrou 183 multas contra a 1001, algumas por encontrar extintor vencido e o aparelho que mede a velocidade sem lacre.

25/10:

1) O ônibus do acidente passou por análise 55 vezes;

2) O veículo foi multado no dia 12;

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