A Viagem: As muitas vozes da trajetória humana

Cena do filme A VIAGEM 1A Viagem se inicia com um velho, sentado próximo a uma fogueira, preparando-se para contar uma história. Ao longo do filme, descobriremos que ele a estava contando para um grupo de crianças. Contudo, a história dele será apenas uma de um grande mosaico elaborado pelos diretores Tom Tykwer e Andy e Lana Wachowski. O resultado é uma narrativa ambiciosa e impressionante.

Ao todo são seis. Em 1849, o advogado Ewing vê sua vida mudar graças à viagem de barco para conseguir alguns maoris para o comércio de escravos da sua família. Em 1936, o compositor homossexual Robert Frobisher parte para estudar com um renomado músico e desenvolve uma relação conflituosa com ele. Em 1973, a repórter Luísa descobre uma conspiração para esconder falhas em uma grande usina nuclear.

Cena do filme A VIAGEM 2Em 2012, o editor literário Timothy Cavendish envolve-se numa confusão atrás da outra graças a um autor incapaz de aceitar críticas e ao seu próprio irmão. Na Nova Seul de 2144, a jovem Sonmi-451, empregada de uma lanchonete de fast-food, envolve-se com a resistência contra o governo totalitário. E em uma época indeterminada de um futuro mais distante ainda, a tribo de Zachry é visitada pela nave de Meronym, e ele é forçado a enfrentar seus medos e superstições para ajudá-la numa perigosa missão.

Baseado no livro escrito por David Mitchell, tido por muitos como “infilmável”, A Viagem é o produto de cineastas audaciosos que não temem em exigir um pouco do público, acreditando na capacidade deste de responder à suas inquietações. Não à toa, Tykwer – responsável por Corra Lola Corra (1998) – e os Wachowskis – criadores da trilogia Matrix – usam um dos personagens, logo no inicio, para pedir “um pouco de paciência” do espectador. Pois aos poucos a ideia central, “o método por trás desta narrativa maluca”, ficará clara.

A Viagem é sobre muitas coisas: sobre como a história se repete, sobre como nós “cometemos os mesmos erros repetidas vezes”, sobre personagens em busca de uma libertação. E, acima de tudo, sobre como estamos interligados às pessoas que conhecemos. Tendo esses conceitos como base, Tykwer e os Wachowskis transformam seu filme no análogo de uma sinfonia, composta de vários instrumentos – e não é à toa que o personagem Frobisher compõe, ao longo da sua história, o sexteto intitulado por ele de “Cloud Atlas”, sinfonia esta que resulta no título original do filme.

Cena do filme A VIAGEM 3

Essa noção de interligação é trazida à tona por vários aspectos, e o primeiro deles é o elenco. No grande elenco reunido pelos diretores, temos Tom Hanks, Halle Berry, Jim Broadbent, Ben Whishaw, Jim Sturgess, James D’Arcy, Doona Bay, Hugh Grant, Keith David, Susan Sarandon e Hugo Weaving. E eles aparecem em praticamente todas as histórias, disfarçados sob maquiagem mas ainda reconhecíveis (quase sempre). Às vezes, eles interpretam personagens de etnias e mesmo sexos diferentes. Assim, as figuras que vemos no filme são basicamente as mesmas, persistindo pelos vários períodos históricos.

Em um filme como esse, uma montagem fluida é fundamental. A de A Viagem é outro aspecto que comunica a ideia de interconectividade do roteiro. Ao longo da projeção, saltamos de uma linha narrativa para outra, muitas vezes com rapidez. A confusão nos primeiros minutos é inevitável, mas logo o espectador “pega o ritmo”.

Tom Hanks e Halle Berry em A VIAGEM

Tom Tykwer dirigiu as histórias passadas em 1930, 1970 e a do presente, enquanto os Wachowskis dirigiram as do século XIX e as futuristas (nestas, o toque dos criadores de Matrix é evidente). E, de fato, o filme acaba sendo também um mosaico cinematográfico, no qual os diretores conseguem trabalhar em diversos gêneros. Afinal, uma das histórias é um drama, outra uma comédia, outra uma ficção-científica, outra um thriller de suspense… O resultado final é o de vários filmes dentro de um só, interligados pelo tema central e por alguns elementos, e a graça é “montar o quebra-cabeça”.

Alguns problemas na maquiagem e um desnível em certas histórias diminuem um pouco o filme. Mas no fim das contas há tantos bons momentos que esses problemas não comprometem a experiência. O tema principal a unir todas as linhas narrativas é a conexão entre as pessoas. Não importa a época, o contexto social ou as forças que o oprimem, o ser humano sempre se ligará a outros e extrairá dessa conexão a força para continuar e transcender.

Cotação: ★★★★  Muito Bom

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