Num subúrbio americano, onde a altura da grama e o nível de conservação da pintura das paredes da casa são indicativos de sucesso, cinco suicídios são o prenúncio da decadência de um bairro – e, de certa forma, de toda uma sociedade. Esse acontecimento marca para sempre a vida de alguns meninos da vizinhança, que acompanham de forma voyeurística a vida – e a morte – das irmãs Lisbon.
“No fim das contas, as torturas que despedaçaram as meninas Lisbon apontavam para uma simples e fundamentada recusa em aceitar o mundo que lhes tinha sido entregue, tão cheio de falhas”.
“O que minha yia yia nunca conseguiu entender sobre os Estados Unidos é por que as pessoas passam o tempo inteiro fingindo que estão felizes”.
Jeffrey Eugenides tem um estilo bem lírico de contar estes acontecimentos. Narrado pelos meninos – agora na faixa dos quarenta – que só conheciam as Lisbon de vista, o livro deixa os leitores sem saber o real motivo dos suicídios. Assim como todos os adolescentes quando descobrem o primeiro amor, os que narram “As Virgens Suicidas” endeusam as misteriosas garotas Lisbon a tal ponto que fica difícil conhecê-las de verdade. Por vezes, tive a impressão que as meninas eram como sereias: criaturas mágicas e perigosas, responsáveis – mesmo após a sua morte – pela ruína de todos os que ousavam se aproximar delas.
As sereias, porém, possuem uma arma ainda mais terrível do que seu canto: seu silêncio.
Franz Kafka – O silêncio das sereias
Também chama atenção a forma tragicômica com que tudo é relatado.
“Na manhã em que a última filha dos Lisbon resolveu que tinha chegado sua hora de se suicidar – foi Mary desta vez, e remédios para dormir, como Therese – os dois paramédicos chegaram à casa sabendo exatamente onde ficava a gaveta de facas, o forno a gás e a viga do porão, na qual era possível atar uma corda. Saíram da ambulância, em nossa opinião, com a lerdeza de sempre, e o gordo disse baixinho: ’não estamos na TV, pessoal, isso é o mais rápido possível’”.
A história em si, no entanto, não chamou tanto a minha atenção quanto a ideia da casa que apodrece junto com a família. Eugenides gasta páginas descrevendo a decrepitude da casa da família Lisbon a medida que eles se fecham em si mesmos – e mais suicídios acontecem.
“A essa altura, a desintegração gradual da casa começava a ficar mais explícita. Percebemos como as cortinas estavam esfarrapadas e em seguida nos demos conta de que não estávamos olhando para cortinas, e sim para uma camada fina de sujeira, com áreas limpas circulares criadas pelas meninas para espionar o mundo exterior”.
Lançado em 1993 e adaptado para o cinema por Sofia Coppola, “As Virgens Suicidas” é um clássico da literatura norte-americana contemporânea.